Por Maria Helena Esteban. Foto Filico. Copyright Fato Editorial.
O italiano Nello Cassese é o mais jovem profissional a ocupar o posto máximo da gastronomia do Belmond Copacabana Palace (@belmondcopacabanapalace). Aos 34 anos, atua como chef-executivo do hotel onde, desde os 30, está à frente do Cipriani. Para o restaurante de veia italiana, conquistou pelo segundo ano consecutivo uma condecoração no Guia Michelin, pautando-se em um caminho que há bom tempo já vem sendo guiado pela desejadíssima estrela.
No caminho estrelado
Antes de aportar no Rio, @nello.cassese trabalhou em casas com uma, duas e três estrelas, na equipe de Gordon Ramsay (@gordongram) ¬ que tem operações no Reino Unido e nos Estados Unidos e fez fama mundo afora, pela tevê, como o chef durão de realities gastronômicos (para citar apenas uma de suas bem-sucedidas experiências).
Rigoroso, tímido e detalhista, Aniello (este é seu nome de batismo) se esmerou em implantar, a partir de suas raízes, uma cozinha que ele mesmo define como “inovadora, mas sem perder o foco da tradição. Qualquer ideia de prato nasce de um outro prato já existente, tradicional, e depois eu modifico com consistências, apresentações, sabores diferentes, mas sem perder a tradição. Então seria uma culinária italiana inovadora”.
Quais os maiores desafios que você encontrou no Brasil?
Inicialmente foi o idioma. Depois, um dos maiores desafios foi mudar um pouco a concepção de alguns pratos italianos, para que pudessem refletir a tradição de forma fidedigna.
Tentar trabalhar com produtos italianos de verdade, para mostrar o estilo da culinária, pois a culinária italiana, em si, é feita de produtos: se você não tem o produto fundamental para executar determinada receita, não conseguirá recriá-la como manda a tradição ou alcançar o mesmo sabor.
Pelo segundo ano consecutivo, o restaurante Cipriani foi condecorado com uma estrela Michelin. O que representa para você essa conquista? Pretende ir em busca de duas ou três estrelas?
Para mim significa uma grande realização. Não só pessoal, mas também da equipe que trabalha incansavelmente comigo. Fazendo uma comparação, é como ganhar o Oscar da culinária, que reflete muito o estilo de cada restaurante e, também, o estilo culinário de cada chef.
É muito importante a consistência; não é só ganhar a estrela, mas também ser consistente ao longo do tempo. Criar uma equipe de cozinha bem engajada e comprometida com a equipe de salão.
Chef Nello Cassese. Foto: Filico.
É muito importante a consistência; não é só ganhar a estrela, mas também ser consistente ao longo do tempo. Criar uma equipe de cozinha bem engajada e comprometida com a equipe de salão. É, sem dúvidas, um trabalho em conjunto. Nesse momento, quero reconfirmar a estrela e, depois, continuar trabalhando com muita dedicação para ir em busca da segunda estrela.
Desde o ano passado, você também está à frente de toda gastronomia do Belmond Copacabana Palace. Qual impacto esse seu novo cargo está trazendo para os outros dois restaurantes do hotel, o Mee e o Pérgula?
Foi muito importante, na verdade, foi uma reconquista, pois antes de chegar no Brasil eu trabalhava como chef-executivo de um hotel, além de chef-executivo dos restaurantes gastronômicos. É claro que, nos restaurantes do Belmond Copacabana Palace e especialmente nas cozinhas, venho trabalhando desde o ano passado para que o padrão no Mee, Pérgula e, também, na parte de banquetes seja o mesmo do Cipriani.
Já colaborei nos cardápios de Réveillon do ano passado e no de Carnaval e os clientes reconheceram essas mudanças. Viram que é possível aumentar ainda mais a qualidade e o nível de entrega de pratos para um número grande de pessoas.
Com relação à padaria, estamos utilizando hoje apenas o levain, ou seja, o fermento fresco.
Ano passado, por exemplo, foram quase duas mil pessoas no Carnaval e a parte da gastronomia funcionou muito bem. Meu desafio, a cada dia, é sempre melhorar ainda mais não só o Cipriani, mas também os outros outlets. Com relação à padaria, estamos utilizando hoje apenas o levain, ou seja, o fermento fresco. A qualidade dos folhados, pães e outros itens servidos no hotel está incomparável e os próprios clientes reconhecem essa qualidade diferenciada que buscamos oferecer sempre no Copa.
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Hoje, no Cipriani, você serve dois menus degustação diferentes, à noite. Qual a característica de cada um deles?
Um dos menus-degustação é Chef’s Signature Dishes, que são pratos que representam o meu estilo de culinária, desde a minha chegada como chef do Cipriani. Utilizo poucos ingredientes ? máximo de três ou quatro, mas de altíssima qualidade, como por exemplo, vinagre balsâmico envelhecido 30 anos, parmigiano reggiano envelhecido 36 meses, carne de wagyu, uísque defumado 23 anos etc. O outro menu é o Tradition-Innovation ? os pratos nascem da tradição e vêm inovados nesse menu, que fala das tradições que temos em diferentes regiões da Itália.
É muito importante ressaltar a gastronomia italiana, cada região tem estilos e tradições culinárias completamente diferentes. Começamos com a região da Campania, depois com a Toscana e no final de janeiro a região será a Sicília.
Se não me engano, alguns pratos que estão no menu Chef’s Signature Dishes foram executados por você quando ainda nem tinha sido contratado. É verdade que você executou os pratos Raviolini del Plin e Tiramisù 2.0 quando esteve aqui ainda para mostrar seu trabalho? O que esses pratos têm que encantaram os contratantes e ainda conquistam o público?
Sim, é verdade. Foram esses dois pratos que elaborei no tasting menu, mas que hoje em dia já sofreram modificações. Apresentam o meu estilo de culinária: poucos ingredientes, mas de altíssima qualidade, sendo que busco sempre inovar, sem esquecer a tradição.
Apresentam o meu estilo de culinária: poucos ingredientes, mas de altíssima qualidade, sendo que busco sempre inovar, sem esquecer a tradição.
Chef Nello Cassese. Foto: Filico.
Foi possível mostrar que além do prato tradicional, dá para elaborar um prato tradicional e inovador ao mesmo tempo, sem trair ou esquecer os sabores tradicionais. Por exemplo, o Raviolini del Plin geralmente vem recheado com três diferentes tipos de carnes e legumes, e eu optei por fazer recheado com frango alla Cacciatora, que é um prato tradicional da Toscana. Mas a forma do raviolini é aquela tradicional, fechada com as mãos, como se estivesse beliscando a massa.
E o Tiramisù 2.0, que agora é 2.3, ao invés de servi-lo no “empratamento” tradicional, conseguimos descontruir e inovar cada ingrediente para depois recriar no paladar o mesmo sabor do tiramisù tradicional.
Você despertou para a gastronomia ainda na infância. Naquele tempo, o que o motivou e inspirou?
Desde a infância eu sempre tive paixão pela gastronomia, pela culinária. O que mais me motivou foi ver a minha avó e depois a minha mãe acordando cedo pela manhã, para cozinharem para a família toda, ou seja, cozinhavam com aquela paixão mesmo (sem ser profissional) para agradar a família.
Hoje em dia, o mais importante do meu trabalho é criar pratos surpreendentes para os clientes, entregar aos clientes uma experiência diferente da que eles possam ter em casa. Tento recriar o que acontecia comigo quando eu era criança e via minha mãe e minha avó indo cedo para a cozinha com toda a alegria para agradar o paladar de seus familiares.
Depois de decidir pela profissão, quem foram suas referências?
Ao decidir seguir essa profissão comecei a frequentar a escola de hotelaria, depois trabalhei bem jovem na Toscana e, já graduado, trabalhei em um restaurante que, na época, estava com uma estrela e agora tem duas estrelas, chamado Taverna Estia (que fica perto de Nápoles). Tive uma impressão difícil no começo e até pensei em não continuar com o trabalho, que era muito difícil e exaustivo, mas depois de seis meses tive a oportunidade de viajar para a Inglaterra, onde fiquei quase um ano e meio, e comecei a trabalhar na Holding de Gordon Ramsay. Trabalhei nos restaurantes dele, com uma, duas, três estrelas Michelin.
Após isso, fui para a França trabalhar com um chef italiano – que trabalhou com Gordon Ramsey. Depois passei sete anos na Toscana, trabalhando em um restaurante que ficava dentro de um hotel-boutique, sempre com a supervisão de Ramsey. Hoje em dia me inspiro muito nele, obviamente, no sentido de técnica, mas também em muitos chefs italianos, como Massimo Bottura e Emanuele Scarello, que tem duas estrelas Michelin, ou mesmo Vito Mollica, de Florença.
Confira também a entrevista com Nello Cassese em vídeo: